Forte, bonito,
imponente, a sua postura é ereta, seu olhar é altivo e suas palavras são
cuidadosamente articuladas quando ele abre sua boca. Também não há entre os
pecados quem seja mais sábio do que o orgulho. O orgulho tudo sabe, tudo
controla, tudo calcula, tudo prevê. É nas mãos do orgulho que se encontram
todas as virtudes. Para ele tudo sempre está sob controle, porque ele é o mais
virtuoso dos pecados e nada poderia sair diferente daquilo que ele entende como
correto.
Diante desta
ousada, porém, realística descrição, emerge, então, um pertinente
questionamento: seria mesmo o orgulho um pecado? Que mal haveria em orgulha-se
alguém daquilo que é verdadeiro? Se realmente sou o melhor, ou o mais bonito,
ou o mais forte; se realmente sou incomparável, impecável, imbatível; se tudo
está sob controle e eu sou o mais perfeito e calculista dos homens, que mal
haveria em orgulhar-me disso? Minhas virtudes não são dignas de minha soberba?
Ora, como poderia ser pecado aquilo que só existe em função das minhas
virtudes?
Certa feita,
disse o Senhor à Satanás: “Tens visto meu servo Jó? Saiba que não há na terra nenhum
homem que a ele seja semelhante. É um homem íntegro e reto, que teme a Deus e
que se desvia do mal”. Palavras do Senhor, portanto, verdadeiras. O que poderia
dizer Jó para contrariar as palavras que o próprio Deus estava dizendo? Deus
sabia que Jó era o melhor homem que havia na terra. E Jó, modéstia à parte,
também sabia disso.
Ele era tão
justo e sábio que chegava ao ponto de acordar de madrugada para oferecer
sacrifícios ao Senhor em prol dos seus filhos adultos. “Talvez tenham pecado os
meus filhos”, ele raciocinava, “então, eu já tomo as minhas providências”. Com
Jó, tudo era calculado. Seu raciocínio era lógico, sua sabedoria era grande e
sua justiça era a mais pura que existia. Sim, ele era tão bom que até Deus o
admirava. Por que então um homem como este não poderia nutrir dentro de si um
orgulho?
Bem, lembre-se
do que falei. O orgulho é o pecado mais bonito que existe.
Jó, o nosso
personagem perfeito, era rico, saudável e feliz. De um dia para o outro perdeu
tudo. Já não tinha mais filhos, nem saúde e tampouco felicidade. E
aparen-temente não havia nenhum motivo para que Deus permitisse que aquilo
acontecesse o mais justo dos homens. É neste momento então, que começamos a
entender qual era o problema de Jó. Não, ele não era blasfemador, nem
assassino, nem ladrão, nem desones-to, nem explorador. Não era adúltero, nem
mentiroso, nem alcoólatra. Tampouco era um mal pai, um mal marido ou um mal
adorador. E seu amor por Deus era tão real quanto ele professava ser.
O problema de
Jó era apenas um. Era um problema interno, que talvez ninguém pudesse enxergar.
Provavelmente nem mesmo ele sabia que o tinha; e, se sabia, não o encarava como
um problema. O problema de Jó era o orgulho.
Jó se orgulhava
de ser justo e de ser sábio. Talvez mais ainda de ser sábio. Sua sabedoria era
o seu senso de justiça. E apoiando-se naquilo que conhecia, achava-se seguro.
Mais seguro que qualquer homem. “Sei o que é certo e o que é errado. Sei que
estou fazendo o que é certo. Portanto, sei que não há nenhuma falta que Deus
possa atribuir a mim”.
Não, ele não
estava menosprezando Deus. Mas estava exaltando a si mesmo em seu interior. Se
por um lado Deus era maior que todos os homens (e disso ele não tinha nenhuma
dúvida), por outro lado Jó se sentia maior que todos os que estavam abaixo de
Deus. “Eu me conheço. Não se trata de orgulho, mas de realidade”.
Foi este mesmo embalo
que levou Pedro a dizer que jamais negaria a Jesus. E o próprio Deus, encarnado
em um corpo de Filho de homem, precisou informar com pesar ao seu discípulo
orgulhoso: “Hoje mesmo tu me negarás três vezes”.
De todos os pecados que existem, o pecado mais
bonito é o orgulho. Na maioria das vezes não o encaramos como um pecado real. E
quanto mais ele se desenvolve, mais belo ele se parece para nós. Porque a sua
aparência, na realidade, é a das virtudes com que se veste. Quando olhamos para
o nosso orgulho, não vemos um pecado. O que vemos são as nossas virtudes. E
assim a soberba se torna um tumor, enraizando-se pelo nosso ser.
Os sintomas?
Ah! Tornamo-nos sábios e justos, donos de tudo. Com o orgulho nós tudo sabemos,
tudo controlamos, tudo calculamos, tudo prevemos. Não há nada que possa
acontecer diferente daquilo que julgamos correto. E assim nos distanciamos cada
vez mais de Deus, sem perceber. Tornamo-nos o nosso próprio Deus. Um Deus “justo
e sábio” que já não é mais aquele no qual acreditávamos.
Mas é neste
ponto angustiante em que cremos realmente que somos perfeitos e controladores
de tudo, que a vida nos dá um golpe. E é a violência com que caímos no chão que
nos faz questionar: “Não tinha eu o controle de tudo? O que houve, então?”.
Jó não
blasfemou. Mas por um longo tempo, muito embora reconhecesse Deus como
soberano, continuou a querer justificar-se. Ele era sábio. Ele era justo. Ele
sabia que não havia nada de errado. Então, para salvá-lo daquele terrível
círculo vicioso de justificações, Deus entra em cena. A sua primeira pergunta é
chocante: “Quem é este que escurece meus desígnios?” E logo Depois: “Onde
estavas tu quando eu lançava os fundamentos da Terra? Diga-me, se é que tens
entendimento”.
O discurso de
Deus é gigantesco. Mas se pudéssemos resumi-lo em uma frase, apenas uma frase,
poderíamos dizer: “Você não sabe tanto assim”.
Aqui cai todo o
orgulho. O que é o homem longe de Deus? Que sabedoria tem? Que justiça tem? Que
controle tem? E o que é o homem para acreditar que vale mais que os outros
homens, se ele é tão orgulhoso quanto todos os outros? A verdade é apenas uma:
o homem não é nada quando pensa ser alguma coisa. Por si mesmo é apenas um
monte de barro. Não é sábio, não é bom e nada controla. É apenas com Deus que
realmente podemos valer alguma coisa.
Diante de todo
o discurso, Jó, então, apenas diz: “Falei do que não entendia. Eu te conhecia
só de ouvir, mas agora meus olhos te vêem”. Sim, o orgulho foi quebrado. E foi
ali que Jó viu a Deus.
O orgulho é o
pecado mais bonito de todos. Porque ele carrega nas mãos todas as virtudes,
menos uma: a de enxergar que sem Deus, nós não temos virtude nenhuma.
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