domingo, 18 de julho de 2010

Eu, Escritor

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Sempre gostei de escrever. Quando eu era pequeno, costumava a criar histórias e adorava quando os professores me pediam para fazer redação. Eram nessas horas que podia colocar toda minha criatividade e imaginação no papel. Talvez por esta causa eu não gostasse que me dessem temas. Eu queria fazer meu próprio tema. Queria ser livre e escrever o que viesse em minha mente.

Entretanto, com toda essa imaginação e sede de colocar algo no papel, eu possuía alguns problemas literariamente sérios. O primeiro, muito comum era oposição entre querer escrever um livro e não conseguir sair da segunda página. Não foram poucas as vezes em que pus a mão no lápis, separei um bloquinho de papel e não consegui sair da introdução. O velho problema de milhões de ideias e nenhuma expressão. Eu tinha o começo e o fim, mas não havia desenvolvimento.

O segundo problema, mais sério que o primeiro também me era muito contraditório. Vejam vocês, eu que adorava escrever, não tinha o hábito de ler. Pegar um livro para mim já não era fácil. Terminar um livro era quase impossível. Eu não tinha interesse, nem concentração e enfim, mas uma vez eu caia no problema de não conseguir prosseguir em nada que eu começasse.

Outros problemas como falta de experiência, falta de vocabulário e repetições desnecessárias de palavras no texto se mostravam menos graves e compreensíveis, já que eu não tinha nem dez anos. O que eu não sabia era que todos os meus problemas poderiam ser consertados com apenas duas atitudes: Habituar-me a ler e prosseguir escrevendo a todo o custo.

Foi com dez anos, então, que meu quadro começou a mudar. A minha mãe me contou a história de um homem chamado Robson Crusoé. Um náufrago que viveu anos em uma ilha e tal e tal. A história me interessou tanto que na mesma semana passei na biblioteca da escola e procurei o livro desta. Por sorte encontrei. Ao abrir aquele livro, eu não sabia, mas abria uma nova vida.

O suspense do livro, a vontade de saber o que iria ocorrer, a aventura, o mistério, tudo me fez prosseguir. Ao terminar aquele livro a minha mente se abriu em várias partes. Partes que queriam saber mais. Viajar pelo mundo das letras que carregavam suspense e aventura, mistério e ação. A biblioteca virou minha segunda casa. Em um ano, eu que não lia, li vinte livros. Quase dois por mês.

E minha mente não parou de se expandir. Ganhei um pouco mais de vocabulário, passei a escrever melhor e minha sensibilidade se desenvolveu. De início foram só mistérios, mas logo vieram os romances, os livros sociais e por fim o livro que deu o ponta pé inicial para que eu começasse uma transformação para escritor: A Bíblia.

Um livro que para muitos significa apenas um punhado de histórias antigas e complicadas, mostrou-me um vestígio de sua sabedoria. Chamou-me a atenção, primeiramente a verdadeira poesia apresentada no primeiro capítulo do Evangelho de João, em que Jesus é apresentado como o verbo. O verbo, que é o centro das orações, a palavra que define todos os mecanismos de um período.

Quis usar aquele verbo, o mais importante verbo e conjugá-lo em minha vida. Tomei, mais uma vez a caneta e com meu bloquinho me pus a escrever, aglutinando as diferentes visões, porém únicas, dos quatro evangelistas da Bíblia Sagrada. E como me impressionei com a tamanha sabedoria que Jesus utilizava em sua vida! Pessoa simples, mas que falava e agia como ninguém. Jamais vi alguém que pudesse discutir com tanta calma, sem o uso de palavras torpes e com certeza de tudo o que dizia. Um homem que mostrava sabedoria com a mesma facilidade que qualquer homem mostraria sua insensatez.

E me apaixonei por aquele maravilhoso amor, capaz de perdoar meretrizes e assassinos, por ver que seus corações estavam cheios de arrependimento sincero. Sim, eu já era cristão. Eu e minha família. Mas foi ali que realmente comecei a descobrir quem era o Jesus de quem tanto me falavam, porém eu conhecia superficialmente. E cada palavra que eu lia e escrevia, me tornava mais apto para me expressar.

O verbo se fez texto em meu viver. A oração me levou para mais perto de Deus. Aquele período simples tornou minha vida composta de palavras. Palavras que me foram ponte para crescer cada vez mais.

O livro terminou. Não era nenhuma grande obra. Nem mesmo continha as minhas palavras. Era mais uma monografia infantil sobre os evangelhos. Não houve estilo meu naquele livro. Eu não tinha estilo. Mas o meu estilo se formou ali, no fim daquele livro.

Entremeando a Bíblia e os livros de mistérios que não me deixavam parar de ler ganhei minhas primeiras fontes firmes de expressão: Poesias e textos. Era o que eu sabia fazer. Assim, fui ganhando o reconhecimento dos que estavam a minha volta e a frase: “Você vai ser escritor” chegou com mais frequência aos meus ouvidos.

Com treze anos, a conquista. Conquista de quê? A conquista do meu próprio reconhecimento. Por mais que eu gostasse de escrever a minha alma gritava: “Tu não terminas o que fazes!”. Claro que não há problema em um adolescente de treze anos não conseguir escrever um livro próprio. Disso eu sabia. Mas quando eu contava todo o estoque de ideias inacabadas a pergunta me atingia como uma bala de fuzil. Eu não me considerava um escritor. Contudo, o projeto que eu carregava há uns dois anos, tendo mudado o enredo mais de quinze vezes, nunca saindo da introdução, foi colocado no papel de uma maneira diferente. Busquei a ideia inicial e prossegui, sem me importar se estava bom ou não. O desafio era passar da segunda página. E também retomei outro, ainda mais antigo, do qual eu nem me lembrava mais. O resultado? Dois livros prontos e a felicidade saber que sim, eu era um escritor.

E os evangelhos? Bem. Ainda fazem parte dos meus projetos. A mesma coisa que fiz quando ainda não tinha estilo, farei, mas incrementado, literário e romântico. Sim, um romance. Sem nada modificar, a história de Jesus é um romance. O romance que modificou a minha vida. Um romance real.

E quanto ao meu estilo? Meu estilo é diverso. Tudo o que li desde que descobri a leitura, formou o meu estilo. Tudo o que li, tudo o que vi, tudo o que senti. E não só os livros, mas o mundo em si. Porque o sábio tira proveito de tudo. Um filme, uma música, um clipe, uma história, um fato, um desenho, uma imagem, uma tela, um quadro, um quarto bagunçado... E é nessa união das pequenas coisas que podemos, então, pôr para fora algo que de alguma forma contribua para a vida das pessoas e nos faça mais felizes.

Escrevo mistérios e suspenses, aventuras e ação, romances e ficção. Escrevo e misturo tudo. Faço rir, faço chorar, emociono, mostro os sentimentos, faço o real. Pelo menos tento. Pois o bom é poder ver alguém se identificando com um personagem que durante horas e horas afim você se dedicou a criar. Um personagem que passa a fazer parte da vida da pessoa e lhe ajuda a enfrentar o problema que os une. Isso é o que faz um autor feliz.

E Deus está lá, em cada capítulo, em cada parágrafo, em cada linha. Então, minha literatura é cristã? Não. Minha literatura é diversa. Meu estilo é diverso. Qualquer um pode ler e retirar algo que lhe faça bem. Mas Deus está lá. Sempre estará.

Sou sábio? Não sei se sou. Acho que sim. Mas o que sei é que todo sábio sabe que nada sabe perto do que existe para saber. Pergunte a um sábio de oitenta anos se há algo que ele necessite aprender. Ele responderá: “Sim. Sempre haverá”. É assim que eu também julgo. Há muito que aprender e a cada dia devo buscar ser melhor. Não melhor do que alguém. Isso não é uma disputa. Mas ser melhor hoje do que fui, no dia de ontem. Aí está a sabedoria e também é isso que me faz feliz.

Relembro um lance da vida, há muito passado. O autógrafo que recebi de um autor no lançamento de seu livro. Seu nome era André Pereira, lançando o livro infantil A Independência do Brasil. Eu, pequeno, cursando a terceira série, esperava impaciente na enorme fila indiana de estudantes. Chegando a minha vez, o escritor me olhou. Algo nele me fez achar que eu já lhe conhecia, porém não sabia de onde. Sorriu e perguntou:

- Qual é o seu nome, amigo?

- Davi. – Respondi, devolvendo o sorriso.

Ele abaixou a cabeça e ditando o que ia escrever, assinou com caneta preta a dedicatória que anos depois reparei no sentido de sua mensagem. A dedicatória dizia:

“Davi, o outro Davi foi profeta. E você? O que será?”, e terminava com “O amigo André Pereira”.

A pergunta ressoou na minha mente sem muito vigor. Como uma criança de oito anos ia saber o que seria? E passada a euforia de ganhar um autógrafo, eu esqueci a dedicatória em um canto do meu quarto. Oito anos depois deparei-me com a lembrança e a pergunta voltou a ressoar em minha mente. “E você? O que será?”. Mas desta vez eu tinha a resposta. Sorri e expressei com gratidão:

- Escritor. Eu serei um escritor.